MEIO DIA E SEIS
Para Rodrigo tudo se trata de um
dia normal. O garoto de apenas 14 anos guarda todo um bloco da janela de cima
de uma laje. Sua ocupação é apenas avisar a chegada dos “tiras” pros outros,
mas, naquela parte do lugar, isso nunca acontece, ninguém se atreve a passar
por ali, então o fogueteiro pode curtir o sol relaxado.
O relógio marca exatamente 12:03
quando seu José desce a escadaria com seu isopor lotado de sacolés e o menino o
avista.
─ Tio, dá um sacolé “aê”! ─ ele
grita da laje assustando o homem.
─ Tá aí ─ ele estica o braço e
entrega ao menino (um de seus melhores clientes) o habitual de coco.
Vermelhinho (como é chamado pela
facção) dá a ele 10 reais e diz para o homem guardar o troco, afinal, essa era
a maneira que ele havia encontrado para demonstrar toda a sua riqueza.
Rodrigo volta para seu posto e
deita em sua cadeira de praia, abre seu sorvete e, quando coloca na boca, ouve
a voz de Juninho, o fogueteiro que alterna turno com ele:
─ Os tiras tão subindo! Mete o pé,
garoto!
O barulho das chinelas do outro
menino agora está distante e Rodrigo não sabe bem o que fazer. É sua primeira
vez acionando os fogos. Ele fica nervoso, larga o picolé no chão e acende um rojão
tapando os ouvidos. Acende mais um e,
satisfeito com o seu trabalho, recolhe o sorvete já correndo a escadaria acima
como nunca correu antes.
O vento balança seus cachos, ele
se sente livre. Seus pés batem forte contra o cimento, mas eles já não doem há
tempos. Não consegue acreditar que realmente escapou da polícia que
provavelmente veio atrás de drogas na favela. Não consegue acreditar que
conseguiu fazer o que tinha que fazer e ainda saiu “batido”. Rodrigo não
percebe , mas sorri enquanto corre, só tem 14 anos, ainda não sabe nada da vida
e gosta da adrenalina, sente que pode fazer qualquer coisa neste momento.
Uma única bala é disparada
tirando-o de seus devaneios. E mais uma, ela o atingiu. O menino leva as mãos a
sua perna urrando de dor enquanto rola escadaria abaixo. Sua queda é impedida
em algum ponto por um policial, seu sangue agora faz uma poça no degrau e o
sacolé cai sobre a mesma quase vazio e esmilinguido por causa da queda. O
líquido branco se mistura ao vermelho ardente e essa é a última coisa que
Vermelhinho vê. São exatamente 12:06.
Marcelle de Souza Soares (9B)
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